domingo, 27 de novembro de 2016

Turismo de massas e airbnb: a praga


Empresas ligadas à venda ou aluguer de imobiliário, principalmente o tubarão Remax, tem vindo a apostar numa estratégia agressiva junto dos moradores em áreas centrais que, de repente, passaram a ser apetecíveis do ponto de vista turístico. É o caso do Bairro das Colónias onde o airbnb e outras formas de alojamento local passaram a estar presentes em muitos, cada vez mais, dos condomínios e prédios de rendimento.

A Remax, não satisfeita com uma primeira forma de pressão - a sistemática colocação de folhetos nas caixas de correio, interrogando se não estamos interessados em vender andares -, adoptou mais recentemente o mesmo estratagema de várias religiões (ou seitas duvidosas), o porta-a-porta.

Sim, não vos queremos aqui a viver. Sim, a periferia é excelente para habitar. Sim, os lares estão caros e estarão muito melhor por lá.

Percebemos demasiado bem que não nos querem a habitar no centro da cidade, esse é para os turistas que trazem dinheiro e fazem desenvolver a economia local a consumir typical cuisine (e todos sabemos que a gastronomia tradicional é diversificada: paellas congeladas; massa - disparate, pasta; hambúrgueres, pastel de bacalhau com queijo….), a passear de tuk-tuk, a viajar de eléctrico, (sobretudo o 28, o 12 ou o 15 - para nada verem e entupindo qualquer possibilidade dos nativos andarem neste transporte), ou a utilizar os elevadores (Santa Justa, Glória e Bica – o Lavra ainda se vai conseguindo). Nada contra, não fora a massificação e o excesso.

O airbnb tem vindo a contribuir para a destruturação das comunidades locais. As relações de vizinhança desaparecem e a desumanização do espaço urbano, antes de cooperação vicinal e intergeracional, transforma-se num território desolado onde impera a animação momentânea e ruidosa dos grupos que estão ali apenas para cumprir o ritual de se divertirem, fugindo às regras mais restritivas dos seus entediantes países de origem. Há sempre excepções, claro!

A incompatibilidade de horários e de expectativas destes dois grupos, os habitantes pré-existentes e os turistas de passagem em alojamento local, é notória. São totalmente antagónicas e geradoras de situações de conflito, apercebendo-se o cidadão comum que as autoridades parecem favorecer, com um certa condescendência e, por vezes até, paternalismo, os prevaricadores que não cumprem o estabelecido por lei. Existe legislação sobre ruído e horários, mas só os que não sentem a polícia como entidade opressora se atrevem a protestar, telefonando e exigindo a presença das autoridades (que chega a demorar mais de uma hora depois de chamada, ou nem aparece – estratégia de desmotivação?). Acresce a estranheza da questão das coimas que deveriam ser aplicadas aos prevaricadores, pois só são aplicadas, pasme-se, quando a mesma equipa de agentes é chamada ao local da ocorrência uma segunda vez.

Não sendo de “Leis”, embora não podendo alegar o seu desconhecimento, o autor deste blogue interroga-se sobre a permissividade subjacente a toda esta questão por parte das autoridades competentes, sobretudo as municipais.

Para além do ruído, acresce o desgaste dos edifícios, sobretudo das áreas comuns, caso das caixas de escada, elevadores e porta de entrada, que se degradam ou avariam por uma utilização pouco cuidadosa.

A recolha do lixo, que obedece, no caso do prédio que habito e do qual sou coproprietário, a uma calendarização por parte dos moradores, não é cumprida pelos que estão de passagem e que são os maiores produtores do dito, sobretudo de vasilhame, que nem se dão ao trabalho de reciclar (existe um vidrão mesmo à porta do prédio). Mas essas questões de civismo e ecologia são para a terra deles, pois aqui podem fazer tudo o que lhes apetecer. Sim, começo a sentir-me xenófobo, sobretudo em relação aos da Europa rica pseudo-civilizada e pseudo-superior do centro e norte, que acham que na terra dos “pretos” (latinos e africanos para eles são a mesma coisa), podem fazer o que querem. O problema grave é que, pelos vistos, podem mesmo.

Várias cidades europeias importantes têm levantado entraves ao sistema de airbnb, mas em Lisboa o município é cada vez mais flexível a esta questão, pelo que a resistência vai ter de ficar do lado dos cidadãos.

A hotelaria tradicional está ameaçada pelo alojamento local, mas alguma desta também tem vindo a gerar situações de conflito desnecessárias e, até há bem pouco tempo, inexistentes. Veja-se o caso da avenida Almirante Reis, onde partes das passagens sob os edifícios deixaram de ser pedonais e acessíveis a qualquer transeunte. Esse espaço de circulação pública foi ocupado por esplanadas de hotéis ou outros estabelecimentos de restauração e afins, pelo que, faça sol ou faça chuva, quem andar a pé tem de o fazer pelo passeio. O mesmo se passa noutras zonas da cidade. Sob as arcadas do Terreiro do Paço a mim já me tentaram impedir de passar. Cidade mais amigável e acessível sim, mas, nestes casos, apenas para alguns.

O respeito pelo cidadão é fundamental. Os que escolheram Lisboa para habitar, independentemente da sua nacionalidade, têm de sentir que estão em primeiro lugar nas opções e soluções políticas e só depois, melhoradas as condições de habitação, acessibilidades e outras estruturas de apoio local, é que deverá passar-se a olhar para as necessidades do visitante externo que, certamente, se sentirá bem se encontrar uma população “indígena” satisfeita.

Face a tudo isto, nos lisboetas cresce o sentimento de que estão a ser desapossados daquilo que sempre foi seu por direito: o território, as ruas, os miradouros, as vistas, os prédios, os monumentos, os cafés, os transportes públicos, a qualidade da comida. E os preços continuam a subir, embora ainda acessíveis para os turistas.

Não admira que surjam este tipo de documentários propagandísticos